Thursday, April 30, 2009

Pensamento do mês


"O amanhã pertence às mulheres"

Helen Fisher

Tuesday, April 21, 2009

Vida e morte

Nas duas casas vizinhas celebrava-se a vida e a morte: o início de um ciclo para um ser humano e o fim para outro. Em ambas as casas há convidados. Ampara-se as pessoas mais directamente envolvidas por tais circunstâncias.

É assim que praticamente começa o filme Gran Torino, de Clint Eastwood, o próprio no papel de Walt Kowalski, o homem que acabara de enviuvar. Walt é um tipo mal-humorado, azedo, que tem sempre na ponta da língua uma crítica mordaz para fazer a todos quantos ousam dirigir-lhe a palavra: os filhos, netos, o padre, etc. Ninguém o suporta e a única excepção fora, ao que parece, a mulher, que acabara de se enterrar.

O problema de Walt é que está mal com a vida porque está atormentado com a morte. Não com a sua própria morte, por ser já um septuagenário, mas com as mortes que carrega pela sua condição de veterano ao serviço dos Estados Unidos na guerra da Coreia. Ainda por cima, os vizinhos que festejam a vida são asiáticos, da etnia Hmong, e Walt projecta neles os seus fantasmas do passado com atitudes racistas, além de os encarar como os causadores dos males da economia americana. A certa altura as duas casas vizinhas cultivam um ódio de estimação.
Contudo, tudo muda quando um gangue Hmong pretende, a todo o custo, integrar o jovem vizinho asiático no seu bando. A iniciação consumar-se-ia com o furto do Gran Torino, o automóvel Ford de 1972, que era a menina dos olhos de Walt.
A partir daí há grandes alterações. O filme mostra que, e apesar das mazelas da vida que todos carregam, é possível derrubar preconceitos, promover a solidariedade e fazer com que a vida e o futuro vençam a morte e o passado.
Clint Eastwood é um mestre. Vejo todo e qualquer filme que tenha a sua assinatura, mesmo que dele não saiba o enredo. E mais não digo para deixar a imaginação de todos quantos pretendem ainda ver o filme.

Tuesday, April 14, 2009

Em nome de Deus, o diabo ...

A Páscoa foi-se (em parte - para os ortodoxos festeja-se nesta semana). E o que ficou? O doce sabor das amêndoas? Dos ovos de chocolate? O gosto do borrego? Do cabrito? Do leitão? O convívio familiar? As férias? O que quer que tenha ficado, e que foi pretexto para dar trabalho à "dentadura" e outros músculos corporais, foi-o à custa da da celebração cristã da vida e morte de J.C.

J. C. pois bem. Muitos de nós, certamente, têm ou tiveram uma relação complicada, difícil mesmo, não só com J. C. mas também, e sobretudo, com a instituição que se apropiou do seu legado: a (s) famosa(s) igreja(s) cristã(s) – no nosso caso também católica, romana, etc.

A dificuldade maior nas coisas de Deus foi, quanto a mim, o facto de em nome de Deus, se ter feito o diabo. E o diabo quando nasceu, foi para todos, como o sol… o bem e o mal e outras coisas que tal… O diabo incluíu toda a panóplia de mimos que são já conhecidos: matar, pilhar, perseguir, violar, acusar, julgar, culpar, atormentar, torturar requintadamente o corpo e a alma, tudo em nome da Cruz(ada) (e) da evangelização. A imposição, à força, de uma fé deixou um lastro de efeitos tão negativos que ainda hoje se faz sentir, mesmo inconsciente e indirectamente.

Assim, podemos dizer em termos gerais que há uma geração de pessoas nascidas entre 1946 e 1964 - conhecidas nos EUA como boomers – que se revoltaram contra a hipocrisia de impôr o terror em nome do amor a Deus de tal modo que, logo que se emanciparam, libertaram as fracas amarras que os prendiam à “sua” religião, alicerçadas mais por medo e por constrangimento social, do que por crença.

Contudo, olhando para J.C. é impossível não simpatizarmos com a sua personagem. As suas diversas facetas tornam-no excepcional. Cada uma das suas imagens vale muito mais do que mil palavras.

Na cruz, J.C. representa a injustiça suprema que pode acontecer a um ser humano. Era um homem bom, com propósitos puros, mas isso não evitou que outros o acusassem e o condenassem à morte. Ninguém está imune ao mal. Para quem acredita na reencarnação, J. C. pode simbolizar a morte injusta pela qual cada ser humano terá “direito” a passar numa das suas vidas.

Já descido da cruz, com Maria ao lado, J. C. simboliza a tragédia da sobrevivência de qualquer mãe que tem o filho morto no regaço. Chorar a morte de um filho é uma das maiores provações pelas quais um humano pode passar.

A morte de J.C. , representada, entre outros, nos quadros a Descida da Cruz, de Gerard David, no séc. XV (arte flamenga presente no Museu de Arte Sacra, do Funchal), ou de Peter Rubens, séc. XVII (barroco flamengo, exposto na Catedral de Antuérpia, na Bélgica), mostra, por sua vez, a solidariedade na dor que os humanos costumam dispensar entre si em situações de infortúnio. É preciso cuidar dos mortos, limpá-los, vesti-los, chorá-los e sentir que nada mais pode ser feito por um determinado corpo, para que a vida possa seguir em frente.

Moral da história: o sentido da Páscoa, mais do que o consumo de doçaria e gastronomia típicos da época, impõe que nos desintoxiquemos de tudo quanto foi feito de mau em nome de Deus. Para quê? Para que também possamos ressuscitar do legado miserabilista que nos foi inculcado e possamos elevar-nos para o céu da esperança e da confiança na vida e em nós próprios. Com dignidade, mesmo que com dor…